terça-feira, 17 de dezembro de 2013

O livreiro


Não conheço uma pessoa que não fale mal de Curitiba. Ou melhor, que não questione a (falta de) simpatia do povo curitibano. Todos muito sérios, compenetrados, irrequietos e nunca, nunca disponíveis para ajudar.
Ou para sorrir.
Ou para se relacionar, o que pressupõe a sadia consciência da existência de outras pessoas no universo.

Moro em Curitiba há quase 08 meses e me encantei com tudo por aqui.
Os prédios, a história, a cultura. As oportunidades, o clima e sim, as pessoas.
Algumas são absolutamente impregnadas pelo ser capital. Correm o tempo todo, mal olham para os lados. Talvez o que mais as chame a atenção sejam as notificações nas redes sociais. Mal do mundo moderno, suponho, quanto mais notificações mais solitária a vida. Pessoas mal-educadas são irritantes. Mas me irrito com elas em qualquer parte do planeta. #quemnunca
Outras moram aqui há 40 anos e ainda andam no centro da cidade como se conhecessem a todos e compram sempre no mesmo lugar, usam suspensório ou chapéu, passeiam com cachorrinhos obesos e te respondem com carinho, quando você pergunta onde fica a biblioteca.

Por esses dias, fui a uma livraria (que fica ao lado da reitoria da UFPR, diga-se de passagem) e tive mais algumas gratas surpresas. A primeira é que o livreiro conseguiu o título que precisava, em menos de 30 minutos, de um outro fornecedor de Curitiba, e pelo mesmo custo original. Só isso ganharia o coração de qualquer capitalistazinho pessoa que dê valor ao seu dinheiro. Livros podem ser caros (embora isso seja questionável), desde que seja justo. E a segunda é mais romantizada.

Estava eu, às 8:40 da manhã, dando uma olhadinha nos livros e esperando a embalagem de presente ficar pronta (do tal título que procurava), quando o proprietário da livraria, um senhor de uns 65 anos (de suspensório e boina, registre-se) resolveu puxar papo. Papo bom. Só os apaixonados por filosofia acham apaixonante falar de filosofia as 8:40 da manhã, mas papo muito bom mesmo.
E esse senhor sugeriu algo inusitado.

Falávamos sobre a importância da família e como sua ausência desintegra a sociedade inteira, e ele puxou um dos seus livros preferidos e disse que queria me emprestar para lê-lo também. Sem pressa. Sem saber meu nome, sem anotar meu cadastro. Sem procurar informações sobre minha vida financeira com meus vizinhos. Sem nada questionar.
Eu tentei recusar, mas pouco. Fiquei tão encantada com o gesto e tão surpresa, que quase não consegui reagir, a não ser perguntar: mas quando devolvo?
E ele: em até um ano, aí você escolhe outros.

Prometi a mim mesma ler o livro agora nas férias (quem sabe faço uma resenha por aqui) e pagá-lo. Mas não sem antes procurar pelo livreiro e dar a ele um feedback da leitura. Certamente alguém com tanta experiência poderá sempre me indicar ótimos títulos. E também surpreendentes experiências de vida.

Mudar de cidade é como sair da sua zona de conforto. Estar longe de várias pessoas que amo não é sempre confortável. Mas não preciso mais me mudar de Curitiba. Tenho um amor que está comigo todos os dias, uma vocação, uma cidade encantadora e agora uma livraria preferida. As pessoas por aqui podem ser bem simpáticas afinal.